Maria e a missão


Introdução:

A mulher ocupa um lugar especial na missão de Deus, pois, de acordo com Gênesis 3.15, o próprio Deus em sua soberania decidiu fazer da maternidade um aspecto fundamental da obra missionária que realizaria: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”. 
É por essa razão que, dentre aqueles que nutriam a esperança de ver a missão de Deus realizada, muitos filhos eram recebidos com a expectativa de que o Senhor estivesse cumprindo a sua promessa. 
Foi nessa esperança que um homem chamado Lameque pôs no seu filho “o nome de Noé, dizendo: Este nos consolará dos nossos trabalhos e das fadigas de nossas mãos, nesta terra que o SENHOR amaldiçoou” (Gênesis 5:29).
A despeito da expectativa messiânica nutrida por Lameque e muitos outros, a missão de ser mãe do messias não recaiu sobre nenhuma mulher do período bíblico coberto pelo Antigo Testamento, mas sobre uma jovem da insignificante cidade de Nazaré, na região da Galiléia, chamada Maria (Lc 1.26).
Focar o nosso olhar na história dessa jovem, que segundo alguns historiadores não possuía mais do que quinze anos de idade, nos revela um dos mais belos modelos de missão das Escrituras e, desse modo, contribui para a nossa postura missionária no contexto que Deus tem nos levantado. 


Maria de Nazaré
É comum entre os cristãos protestantes, dado os erros católicos da mariolatria e a herança anticatolical que herdamos dos missionários que nos evangelizaram, o desprezo a história de Maria. Para os evangelistas, contudo, essa mulher possuía uma posição de significativa importância, pois explicava com o Deus eterno decidiu entrar na história para levar a cabo a sua missão. 
As primeiras comunidades a ler o evangelho segundo Mateus certamente tiveram essa percepção ao ouvir do evangelista que Maria achou-se grávida pela ação do Espírito Santo e que aquele que estava em seu ventre, como fora profetizado, salvaria o seu povo de seus pecados (Mt 1.18-25).
O entendimento desse relato, no ceio da igreja primitiva, com toda a certeza, fora ampliado pela mensagem de Lucas que apontou não só para o Deus que existe em missão, mas de modo muito claro também destacou a posição de Maria como o seu instrumento para materialização de seu projeto redentivo.
Noutras palavras, Lucas nos fala de uma menina que acolhe a missão de Deus que lhe é anunciada por meio de uma visão angelical de maneira aberta e alegre. 
É olhando especificamente para essa narrativa lucana da moça de Nazaré que ouve voz de anjo contar histórias de Deus, que abre com alegria o seu coração para que o Todo-poderoso a use como instrumento participativo de sua missão, que temos, como dito, oportunidade de perceber diferentes e significativas dimensões da missão de Deus para nossas vidas.

As dimensões da missão em Maria
A participação na missão de Deus envolve o reconhecimento de diferentes dimensões. E é justamente isso que podemos perceber na missão de Deus abraçada por Maria.  

a)      A missão e a vocação
O envolvimento na missão requer vocação, isto é, chamado e é justamente esse chamamento divino que percebemos na narrativa de Lucas na missão de Deus abraçada por Maria, e que certamente traria ao seu coração uma firme convicção na execução daquilo que Deus deseja realizar em sua vida.
Essa importante dimensão da missão vivida por Maria pode ser também percebida na experiência de missão de outros homens de Deus na história.  
·         Noé e o chamado para construir a arca (Gn 6.8-9, 11-14)
·         Abraão e o chamado para deixar a sua terra e a sua parentela (Gn 12.1-4)
·         Moisés e o chamado para libertar o povo do Egito (Ex 3.1-10)
·         Josué e o chamado para conduzir o povo a terra santa (Js  1.1,2)
·         João Batista e o chamado de preparar o caminho do Senhor (Jo 1.33)
 A partir dessa perspectiva, podemos concluir que o nosso modelo de missão deve incluir uma firme convicção de Deus nos vocacionou. 

b)     A missão e a graça de Deus.
Não temos qualquer mérito para participar daquilo que Deus está realizado. Integrar a missão de Deus é um grande privilégio que decorre única e exclusivamente de seu favor para com as nossas vidas. 
Lucas, o evangelista, deixa essa ideia em destaque quando nos mostra a cena do chamamento de Maria para missão. Ele nos diz, claramente, que essa jovem de Nazaré fora muito favorecida. 
Uma ideia semelhante é encontrada no Antigo Testamento no livro de Gênesis 6.8. Nessa parte das Escrituras temos o relato de um homem chamado Noé; alguém que, igual a Maria, também achou graça aos olhos de Deus e fora encarregado de uma grande missão.
Ninguém, contudo, parece ter entendido a relação entre missão e graça do que o apóstolo Paulo. Ele, encarregado de um grande trabalho entre os gentios, se via como um vaso de barro depositário de um grande tesouro (2 Co 4.7). 
  Manter viva essa relação dimensional entre missão e graça é uma questão que não podemos perder vista se quisermos cumprir com fidelidade a missão que Deus por sua graça nos chama a realizar. 

c)      A missão e os desafios ou dificuldades.
Jesus, certa oportunidade, contou uma história sobre a missão e os trabalhadores. Ele disse que a seara é grande e poucos são os ceifeiros, o que me leva a questionar: por que temos poucos trabalhadores no campo do Senhor? Qual a razão de haver falta de ceifeiros?
Acredito que muitos evitam o trabalho missionário porque sabem de seus desafios e dificuldades e fogem desses, como se diz no ditado popular, como o Diabo foge da cruz.  Maria, todavia, nos mostra que o engajamento na missão requer o enfrentamento de suas dificuldades e desafios, pois, ela mesma precisou encarar o desafio da má fama e da possibilidade de perder o seu casamento. 
Num mundo onde o conforto tem sido alvo de muitos de nós, refletir sobre essa dimensão da missão é um passo importante para sair do comodismo e abraçar a parte do campo que Deus tem nos chamado a ceifar. 

d)     A missão e a capacitação.
Não há missão sem preparo, sem capacitação, e o trato de Jesus com os seus discípulos é, sem dúvida alguma, um ótimo exemplo para ilustrar essa verdade. 
Além disso, aprendemos também em Jesus que a capacitação envolve uma dimensão natural e outra sobrenatural, pois a missão de Deus, embora instrumentalizada pelo homem enquanto homem, não avança sem o poder de Deus na vida daqueles que são chamados para a missão.
Na vida de Maria essa dupla capacitação é evidente. Primeiro, no fato dela ser mulher, o que a habilitava a conceber e dar à luz filhos. Segundo, na ação sobrenatural do Espírito que a envolveu com a sua sombra e gerou em seu ventre o nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
  Com isso, aprendemos que o preparo para a missão possui uma dimensão horizontal e outra vertical. O preparo humano e o poder de Deus. E que um desequilíbrio dessas dimensões implica no fracasso do projeto missionário. 

e)      A missão e a disponibilidade.

Por fim, para fazer a missão que Deus nos chama a realizar é preciso estar disponível. É bem verdade que para Deus não há impossíveis. No entanto, dentro das possibilidades de Deus está a ação de criar corações disponíveis que se entregam por completo a sua missão.
A postura de Maria é um ótimo exemplo de alguém com o coração aberto para a missão: “Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra. E o anjo se ausentou dela” (Lucas 1:38). E com isso nos mostra que o missionário é alguém que se entrega para as infinitas possibilidades da graça.   

Conclusão
A partir da experiência de Maria com a missão de Deus, relatada no Evangelho de Lucas, podemos extrair as seguintes lições: 

1.      A missão de Deus envolve diferentes dimensões; 
2.      Observar cada uma dessas dimensões é extremamente importante para o bom desempenho da missão.

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