Ensina-nos a Orar: uma síntese das lições da oração do Pai Nosso


            Caia Fábio fora um dos grandes pastores de nosso país. Na década de oitenta, mais especificamente no ano de 1985, esse pastor publicara um pequeno livro sobre oração. Tratava-se da obra “A geração que desaprendeu a orar”; um texto que denunciava a fragilidade da vida de oração da igreja brasileira.
            Passados mais de trinta anos da publicação desse pequeno livro do Caio, as coisas parecem não ter mudado. Na verdade, as coisas parecem se encontrar num estado ainda pior, pois temos atualmente em nosso país, em termos proporcionais, uma igreja três vezes maior da que tínhamos na década de oitenta.
            A falta de uma vida de oração por parte dos santos da igreja brasileira, se acreditamos no valor da oração, certamente tem transmitido uma mensagem extremamente negativa para o mundo que nos cerca, bem como revelado, de maneira implícita, a fragilidade da fé vivida pelos crentes em nossa nação. O que mais chama atenção, contudo, é que a igreja no Brasil ao enfrentar este tipo se situação não está abordando um problema novo. É bem verdade que a história da igreja está repleta de homens e mulheres que passavam horas na presença de Deus que mais pareciam poucos minutos. Todavia, esta mesma história se encarrega de nos alertar que muitos crentes não oravam ou oravam de uma forma equivocada.
            Este era, por exemplo, o quadro religioso no primeiro século e não passara despercebido aos olhos de Jesus. Os evangelhos revelam que o nosso Senhor observou a vida de oração das pessoas e denunciou as suas incoerências.
            Num pequeno trecho bíblico que antecede a oração do Pai Nosso, conforme o relato de Mateus, somos levados a perceber Jesus denunciando a hipocrisia na oração, as orações formais e a prática da oração como simplesmente um meio para se conseguir alguma coisa (Mt 6.5-8). Na parábola do fariseu e publicano, Jesus parece denunciar que no primeiro século havia quem orasse para massagear o seu próprio ego, uma espécie de exercício de auto-satisfação (Lc 18.9-14). É, porém, da vida dos discípulos de Jesus de onde vem um dos piores exemplos da vida de oração do primeiro século: eles não oravam!
            Esta triste realidade encontra-se claramente retratada nos quadro evangelhos. Neles vemos Jesus orando e incitando os seus discípulos a prática da oração, mas não os vemos orar. O que observamos, na verdade, a respeito da vida de oração dos discípulos, é que eles não conseguiam orar nem uma hora (Mt 26.40).
            Esses discípulos, entretanto, presenciaram a vigorosa vida de oração de Jesus e de homens como João Batista e sentiram a necessidade de aprender a orar. Assim, eles se voltaram para o mestre e pediram: “Ensina-nos a orar!” A resposta de Jesus a este pedido encontra-se no texto que ficara conhecido como a oração do Pai Nosso; uma oração que tem orientado a vida de oração da igreja ao longo de sua história.
            Ouvir as lições da oração do Pai Nosso é, portanto, ouvir as lições do mestre da oração a um grupo que havia desaprendido a orar. É encontrar definição e significado para vida de oração. É trilhar o caminho que liga o homem a Deus. É, desse modo, o que a igreja brasileira precisa ouvir. Mas, o que resumidamente, a igreja brasileira aprenderia ao voltar-se para está antiga oração ensinada por Jesus? O que ouviria a igreja brasileira ao repetir para Jesus as palavras dos discípulos: ensina-nos a orar.

  1. Orar é buscar comunhão com Deus.
            A vida de oração da igreja brasileira não é muito diferente daquela revelada nos evangelhos, pois, a semelhança daqueles dias, há quem ore na atualidade de modo hipócrita, formal ou apenas quando necessitado de alguma bênção ou livramento.  Divergindo deste modo de pensar, Jesus ensina que orar é, antes de qualquer coisa, buscar comunhão com o Deus, o Nosso Pai. Não que sejamos seus filhos por natureza. Não que tenhamos o direito de chamá-Lo de Pai ou mesmo condições de transpor o abismo que existe entre Ele e nós. Porém, somos chamados a orar dessa forma por meio da adoção que nos fora proporcionada pela obra do próprio Cristo.
            Orar Pai Nosso, desse modo, é um grande privilégio; é uma graça de Deus. É dirigir-se para o Deus que habita a eternidade, que tem a sua morada num alto e sublime trono, que é santíssimo e digno de todo a honra e louvor. É dirigir-se ao mesmo Deus que decidiu, por meio de seu filho Jesus Cristo, nos receber como seus filhos numa perfeita  comunhão de amor. 
            Quando se compreende esta dimensão da oração do Pai Nosso, se compreende também que esta oração ensinada por Jesus não aponta apenas para a nossa comunhão com Deus, mas também para a comunhão que deve existir na comunidade da fé, pois orar o Pai Nosso não é caminhar isolado por uma estrada que nos dirige para um encontro solitário com Deus. É uma busca por comunhão com Deus que nos leva em direção ao nosso irmão. Caminhar por esta oração é, portanto, envolve-se num contínuo processo de mudança.   

  1. Orar é pedir.
            Embora orar seja em primeiro lugar uma busca por comunhão com Deus, orar não se limita a buscar comunhão com o divino. Orar também é pedir! Isto se encontra muito claro no ensino geral de Jesus sobre a oração, bem como no texto da própria oração do Pai Nosso e é uma das ideias sobre a oração que melhor foi assimilada em todos os tempos.
            Se, por um lado, todos sabem que orar é pedir, nem sempre aqueles que oram pedem a coisa certa. Nem sempre suas prioridades se alinham com as prioridades de seu Pai que está no céu. Faltam-lhes, não poucas às vezes, comunhão de ideias com o Pai. Justamente por esta razão, Tiago já esclarecera que não são poucos aqueles que não recebem porque pedem mal.
Corrigindo esta tendência natural dos crentes de seus dias, Jesus, na oração do Pai Nosso, reorienta as prioridades de seus discípulos. É como se ele estive se apoiando na estrutura do decálogo ou mesmo reeditando a ideia de que devemos buscar o reino de Deus e a sua justiça em primeiro lugar no ensino que traz sobre oração.
            Estas, sem som sobre de dúvidas, são palavras que a igreja no Brasil precisa ouvir e ponderar. Ou seja, que as nossas primeiras petições ao Pai Nosso devem ser: santificado seja o teu nome, venha o teu reino e seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu. Mas, o que é santificar o nome do Deus que já é santo? Por que pedir a vinda de um reino que em parte já se faz presente e só pode ser plenamente estabelecido pelo próprio Deus? E por que pedir para que a sua vontade seja estabelecida se sabemos que nem um dos seus planos podem ser frustados? Como estas palavras, certamente, Jesus deseja ensinar aos seus discípulos que os filhos de Deus devem viver de tal maneira que a santidade de seu Pai esteja claramente manifesta em suas vidas e que, de alguma forma que extrapola a compreensão humana, Deus utiliza-se das orações de seus filhos para estabelecer o seu governo e fazer a sua vontade.
            Orar desta forma não é outra coisa senão reconhecer que Deus tem um plano, uma vontade que é boa, perfeita e agradável, como dissera o apóstolo Paulo, e que o melhor a fazer é nos submeter ao plano de Deus, abrindo as portas de nossas vidas para que Ele venha realizar a sua vontade em nós. 
            A partir desta mudança operada em nossos corações é que se pode compreender o significado das últimas petições, isto é, de que dependemos de Deus para tudo, pois é Dele que recebemos pão, perdão e proteção. A profundidade desta mudança revela-se também no caráter não egoísta das petições. Não se ora o pão meu, mas o pão nosso. Nem perdoa o meu pecado ou me livra do mal, mas perdoa as nossas dívidas e livra-nos do mal. 
            Esta oração não é uma oração socialista fruto de uma ideologia utópica de um país comunista idealizado no departamento de ciências políticas de uma universidade infestada de professores de esquerda. É a oração dos filhos de Deus que compreenderam e se submeteram a vontade do Pai e, por esta razão, já vivem na dinâmica do reino enquanto oram para que o reino venha em plenitude com todas as suas virtudes. É a oração que colocada em prática faz da igreja um lugar harmonioso, agradável e atraente, pois a faz funcionar com um corpo bem ajustado. É a oração que a igreja brasileira precisa voltar a fazer!

  1. A oração muda as coisas
            O homem pós-moderno é cada vez mais descrente na ocorrência de milagres. A ideia de que Deus age no curso da história movido por nossas orações lhe é cada vez mais estranha. Esta é, contudo, uma das grandes lições da oração do Pai Nosso. Cristo Jesus nos ensina que aquele que conhece as nossas necessidades, o Pai Nosso, antes de verbalizarmos qualquer palavra, é também o que se utiliza das nossas orações para mudar a nossa realidade. Ele, diz Jesus, é o grande interessado em abençoar com coisas boas aos que lhe pedirem. 
            É preciso notar que não existe qualquer incoerência entre este conceito e o plano divino, pois, como observado, a primeira mudança operada naquele que se aproxima de Deus por meio da oração se dá em sua própria vida. Não se busca mais a própria vontade, mas a vontade do Pai. Não se vê o mundo sob a ótica do próprio eu, mas da comunidade dos filhos de Deus. Não se busca apenas ser perdoado, mas ser, antes de tudo, perdoador.
            Neste ponto, podemos nos aventurar a responder a seguinte questão: Por que, então, orar se Deus já sabe de tudo? Simples: porque Deus decretou os fins e os meios. Ele não apenas decretou a benção para a vida dos seus filhos, mas também a oração como o meio pelo qual abençoaria a vida do seu povo. É por meio da oração que Ele decidiu que traria grandes mudanças para os seus escolhidos e lhes daria uma nítida percepção de sua presença transformadora no mundo. 
            A oração é, portanto, um recurso poderoso a disposição da igreja. É um caminho aberto por meio de Cristo ao trono da graça. É um meio que o próprio Deus estabeleceu e que os justos utilizaram e compreenderam o seu poder (Tg 5.16)

Conclusão.

            Nesta síntese extraída da oração do Senhor, encontramos o caminho para a resignificação da vida de oração da igreja no Brasil. Trata-se de um modelo simples e objetivo que tem ajudado historicamente o povo de Deus em sua caminhada de oração. Nele, a igreja brasileira, sem sombra de dúvida, compreenderá que a comunhão precede as petições, que as petições devem seguir as prioridades do Pai e que o universo não é uma máquina fechada como pensam os cientistas modernos, mas o teatro onde Deus, por meio das nossas orações, interage materializando a sua vontade.
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Hebert Leonardo

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