O ministério pastoral


A imagem do ministério pastoral, assim como a dos políticos e policiais, anda meio desgastada em nossos dias; um problema gravíssimo que pode ser notado, ao menos, de dois diferentes modos. Primeiro pela grande falta de credibilidade que a figura pastoral goza perante a nossa sociedade. Segundo, pela própria incapacidade da igreja de compreender corretamente o papel do pastor.
Diante de um quadro dessa natureza, não resta dúvidas de que precisamos refletir ou repensar a nossa percepção de ministério pastoral e reconhecer que ela precisa ser restaurada ao seu padrão bíblico.  

Antes, contudo, devemos perceber que problemas a nível de ministério pastoral não são novidades. Mas dificuldades antigas e recorrentes na história da igreja cristã. 
Nos dias do ministério de Jesus, por exemplo, o nosso Senhor já denunciara falsos pastores; o ladrão que não vem, se não para roubar, matar e destruir (João 10:10).
O apóstolo Pedro, por sua vez, nas orientações que traz aos crentes da dispersão, também aponta para a existência de pastores exercendo o pastorado de maneira inadequada, ao indicar que pastores não deveriam pastorear por constrangimento, ganância e muito menos como dominadores do rebanho (1 Pedro 5:2-4).
Na mesma linha de orientação, para citar só mais esse exemplo, o apóstolo Paulo alerta aos pastores de Éfeso quanto aos falsos pastores que iriam se levantar no meio dos verdadeiros logo após a sua saída; o que deveria fazê-los ficar alertas, atentos ao rebanho que Deus os havia confiado (At 20. 27-31).
 Cintes, portanto, de que ao enfrentar as dificuldades do ministério pastoral em nossos dias não estamos enfrentando algo essencialmente novo, podemos encarar melhor o desafio de repensar a nossa visão de ministério pastoral. Isso porque não precisamos refazer um longo caminho em busca de uma solução para um problema antigo e já resolvido.

I - Éfeso e a reflexão sobre o ministério pastoral.  
 A igreja em Éfeso fora uma das comunidades cristãs que teve a oportunidade de realizar uma profunda reflexão sobre os ministérios da igreja através de uma carta endereçada pelo apóstolo Paulo a esses irmãos.
É, especificamente, no capitulo 4 que se encontra a instrução de Paulo, de onde podemos extrair importantes lições sobre o ministério pastoral para a realidade da igreja em nosso tempo.

II – As lições de Paulo sobre o ministério pastoral.
Observando essa narrativa de Paulo, podemos trazer a luz as seguintes percepções sobre o ministério pastoral na igreja primitiva.

a)      O senhor é quem concede pastores a sua igreja.

Nessa passagem da carta de Paulo aos Efésios, temos oportunidade de visualizar um quadro da liderança da igreja primitiva. E o que vemos? Percebemos, em primeira mão, que esses líderes foram dados, de maneira graciosa, a igreja pelo próprio Senhor após a sua obra ter sido concluída. 
Também podemos notar que havia na igreja primitiva líderes voltados para o ministério itinerante, como os apóstolos, profetas e evangelistas e uma liderança dedicada, especificamente, para o ministério local, o pastor/mestre. Mas todos, indistintamente, concedidos pelo Senhor.
É interessante nesse ponto, portanto, observarmos que os verdadeiros líderes e pastores do povo de Deus sempre foram por Ele concedidos. Logo no início do Antigo Testamento, percebemos essa atitude divina na escolha da tribo de Levi; a tribo que o Senhor separara para carregar a arca do conserto e ministrar a sua benção a nação de Israel (Dt 10.8).
Nos dias de decadência espiritual do reino de Judá, de acordo com o profeta Oséias, uma consequência clara e inequívoca da falta de pastoreio daquele povo, vemos o profeta Jeremias anunciando que Deus não estava nem um pouco satisfeito com aquele cenário e que iria dar-lhes pastores segundo o seu coração (Jr 3.15).
Olhando a liderança por essa perspectiva, isto é, como uma dádiva de Cristo para a igreja, ninguém deveria tomar a iniciativa de buscar essa honra para si sem que para isso tenha sido chamado.
E como Deus chama, especificamente, os pastores para a sua igreja? O apóstolo Paulo nos leva a notar que Deus não concede pastores a sua igreja sem que essa participe do processo. Noutras palavras, sem que a igreja reconheça as qualidades e a vocação daqueles que ele chamou para o pastorado.
Essas qualidades fundamentais ao ministério pastoral foram apresentadas por Paulo em suas cartas a Timóteo e Tito (1 Tm 3.1-7; Tt 1.5-9), bem como na carta de Pedro endereçada aos crentes da dispersão (1 Pe 5.1-5).
A partir dessas informações das Escrituras, podemos chegar a uma importante conclusão: as dificuldades que enfrentamos em nossos dias a nível de ministério pastoral, sem dúvida alguma, decorrem da negligência da igreja a essas orientações divinas. Também mostram um norte para a restauração do ministério pastoral: precisamos consagrar pastores com o perfil estabelecido por Deus para a sua igreja.

b)     O Senhor concede pastores a sua igreja para seu crescimento

Algo que a Escritura nos ensina é que Deus não faz nada sem propósito. Nós, infelizmente, nem sempre temos essa postura. Já Deus, no entanto, tudo quanto realiza visa um fim proveitoso (1 Co 12.7). 
Paulo deixa essa verdade muito clara quando trata com os crentes de Coríntio sobre os dons espirituais. Ele não deseja que aqueles irmãos vivessem na ignorância a respeito dos dons espirituais. Por isso ensina que deveriam ter em mente, quando aos dons, que eles eram frutos de uma ação consciente e propositada de nosso Senhor.
Quando fala dos líderes da igreja, o apóstolo tem a mesma ideia em mente: Deus não faz nada sem propósito e, em seguida, passa a apresentar as razões de Deus ter concedido líderes a sua igreja. 
Podemos resumir todas as razões de Deus para ter instituído líderes em sua igreja numa única palavra: crescimento. Ou seja, Deus levantou líderes em sua igreja para que ela cresça.
E quais são as áreas que a igreja deveria crescer como resultado de um trabalho consciente da liderança que Deus havia lhe concedido?
A lista de Paulo pode ser resumida da seguinte forma:

1.      Crescer em aperfeiçoamento para o serviço.
O apóstolo Paulo, nessa mesma carta aos Efésios, nos diz que nós fomos salvos para as boas obras, pois somos feituras de Deus para esse fim (Ef 2.10).
A prática das boas obras no ceio da igreja, todavia, como nos mostra a nossa própria experiência, nem sempre ocorre de maneira natural entre todos os membros e, pelo que Paulo destaca, nem todos parecem plenamente capacitados para o exercício dessa vocação cristã.
É nesse cenário que entra a liderança da igreja. Ela é responsável por levar os eleitos de Deus ao aperfeiçoamento no serviço de modo que cada membro do corpo de Cristo empregue o seu dom em meio a comunidade. E fazendo isso, isto é, ofertando um serviço de qualidade através de seu dom, cada membro contribui para a edificação da igreja.

2.      Crescer em unidade.
 O crescimento no serviço e a edificação do corpo Cristo não são as únicas vias de crescimento a serem perseguidas pela igreja. O povo de Deus também deveria buscar crescimento em unidade.
 A história cristã, desde os dias dos problemas de divisão na igreja em Coríntios, por sua vez, nos mostra o quão difícil é trilhar por esse caminho de crescimento, posto que o povo de Deus, ao longo dos anos, parece mais disposto a viver afastado do que em comunhão.
O que Paulo nos coloca, portanto, é um grande desafio a ser encarado com seriedade por cada um daqueles líderes que Deus havia instituído na sua igreja e o próprio Paulo, ao tratar, por exemplo, dos problemas em Coríntios, esteva disposto a enfrenta-lo a fim de ver a igreja mais unida.
É preciso, todavia, observar que a unidade que Deus desejava ver a igreja crescer não se limita apenas a um ajuntamento de pessoas, o que também, certamente, não podemos desprezar. No entanto, a unidade que a igreja deveria crescer precisaria estar fundamenta numa percepção comum da fé e do conhecimento de Cristo Jesus.
O que Paulo quer dizer com isso? Que a nossa unidade não é simplesmente um ajuntamento de pessoas que decidiram ficar próximas umas das outras, mas uma aproximação que tem fundamento na fé e conhecimento comuns que nutrimos sobre o nosso Senhor Jesus.
Quem nos ajuda a entender melhor essa declaração de Paulo é o apóstolo João quando declara que a nossa comunhão deriva do conhecimento que temos do Pai e do Filho (1 Jo 1.1-4).
A figura dos líderes da igreja é extremante importante para o desenvolvimento desse tipo de unidade, pois são eles os responsáveis pelo ensino doutrinário do corpo de Cristo.

3.      Crescer em maturidade.
 O autor da carta aos hebreus fala de crentes com muitos anos de igreja, mas que ainda não possuíam maturidade. Eram, segundo a própria descrição do autor, como crianças carentes de leite; pessoas necessitadas de que alguém lhes ensinasse novamente as doutrinas elementares da fé (Hb 5.11-14).
Paulo quando escreve para a igreja em Coríntios também nos mostra uma comunidade igualmente infantil. Trata-se de uma igreja mergulha e divisões e muitos outros problemas que para o apóstolo demonstra o grande nível de imaturidade daqueles irmãos (1 Co 3.1, 2).
O desejo de Deus para a sua igreja, contudo, é que ela cresça em maturidade. Que cada membro se pareça a cada dia mais com o seu senhor e salvador Jesus. E isso tem um grande propósito: para que eles não sejam enganados pelos falsos ventos de doutrina que vez por outra circulam nos corredores da comunidade do povo de Deus. 
Nessa área é inegável também a importância da liderança para o crescimento em maturidade do povo de Deus.

4.      O crescimento numérico.

O crescimento número é algo desejado por muitos líderes em nossos dias que para isso recorrem aos mais diferentes métodos de crescimento e suas lógicas pragmáticas a fim de ver a igreja aumentar de tamanho. 
No texto de Efésios, o apóstolo Paulo nos fala que o crescimento numérico é também um aspecto esperado pelo Senhor para a sua igreja. Todavia, o nosso Deus não deseja que a sua igreja aumente de tamanho seguindo uma receita de regras pragmáticas, como temos observado atualmente.
O método para uma igreja experimentar o crescimento número, por sua vez, passa por outras experiências de crescimento e surge como uma consequência natural dessas. Noutras palavras, para uma igreja vir a experimentar um crescimento numérico saudável esse deve vir antecedido de um crescimento em serviço, unidade e maturidade que leva a comunidade da fé a funcionar como um corpo bem ajustado.
Nesse aspecto, o papel da liderança é fundamental, pois ela é que lança as bases para o crescimento número e trabalha para suprimir todos os obstáculos que, por algum motivo, o impeçam de se manifestar.

5.      Crescimento em amor.
O crescimento multifacetado da igreja, como demonstra o último verso de nossa perícope, deve estar fundamentado em amor e não poderia ser diferente, pois é no amor que todas as nossas ações encontram sentido e significado (1 Co 13).
O ativismo cristão, como parece ter ocorrido posteriormente com a igreja de Éfeso (Ap 2.1-7), nos impede às vezes de perceber essa verdade. Contudo, como posto, a igreja deve rejeitar o caminho das obras divorciadas do amor.
Nessa parte temos também algo interessante a notar e que em grande medida diverge daquilo que observamos em nossos dias. O que seria? O amor sem conteúdo concreto. Diferente dessa percepção, o amor cristão e a verdade que fomenta o serviço, a unidade e a maturidade andam de mãos dadas.
O plano divino para o crescimento da igreja apontado pelo apóstolo Paulo a igreja em Éfeso revela a importância dos líderes para a igreja do Senhor. Especialmente dos pastores, aqueles que exerceriam a sua missão mais próximos da igreja local e que teriam, por isso, mais condições de acompanhar o crescimento do rebanho em serviço, unidade, maturidade, quantidade e amor.

c)      O senhor concede o instrumento para o crescimento da igreja.

No texto que lemos, o apóstolo Paulo nos mostra com muita clareza a importância dos líderes para o crescimento da igreja. Todavia, ele não nos diz claramente qual é a ferramenta que essa liderança deveria usar para fazer a igreja de Deus crescer.
O contexto da passagem, contudo, não nos deixam qualquer dúvida de que o ferramental a ser empregado pelos líderes das comunidades cristãs é a própria palavra de Deus, que no entender de Paulo, em contato com os pastores de Éfeso, tem o poder de edificar a sua igreja. (At 20.37). 
Por essa razão, Paulo entende que um bom pastor é aquele que se dedica a palavra e ao ensino (1 Tm 5.17). Ele é digno de dobrados salários e honra. E, como bem observou o profeta Oséias, de extrema importância para que o povo de Deus não venha a perecer (Os 4.6).

III - Aplicações:

A partir dessas palavras de Paulo, podemos extrair as seguintes lições:

1.      O ministério pastoral é concedido por Deus a sua igreja;

2.      Os pastores que Deus levanta devem possuir as qualidades reveladas por Deus em sua palavra;

3.      O ministro do evangelho é dado a igreja a fim de que ela cresça em serviço, unidade, maturidade, quantidade e em amor;

4.      A ferramenta do pastor é a Palavra.

5.      Conhecer essas lições nos ajuda a reconhecer os falsos pastores e suas igrejas e honrar os homens que Deus tem levantado para o pastorado.   

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