Há salvação para Satanás?


Óleo sobre madeira de carvalho. Século XVI. Museu Nacional de Arte Antiga Lisboa.*

Introdução:
  • Recentemente recebi a seguinte pergunta: haverá ainda oportunidade de salvação para o Satanás e seus anjos? 
  • Não é a primeira vez que me deparo com esse tipo de questão. Já ouvi essa ideia em círculos que defendem o universalismo extremado, isto é, a posição de que no fim de tudo Deus trará salvação a todas as suas criaturas, até mesmo para o Diabo e o restante dos anjos caídos. 
  • Quando era mais jovem, também vi essa mesma pergunta sendo feita por um irmão na Escola Dominical. O irmão perguntará: Se o diabo quiser se arrepender, ele pode? 
  • Segundo meu modo de enxergar, nesses questionamentos existe um incompreensão do que a Palavra nos ensina a respeito da salvação e dos anjos caídos.  
Vejamos assim algumas considerações bíblicas sobre esses assuntos. 

Desenvolvimento

a) Quem é o Satanás? 
Contanto não seja um assunto legal, a Bíblia nos traz muitas informações sobre Satanás; esse anjo caído que em algum momento entre Gênesis 1.31 e 3.1-5 se rebelou contra Deus. E o que ela nos diz? 
  • Satanás é o nosso adversária: Esse é literalmente o sentido do nome Satanás, do hebraico satan, e o teor do seu caráter revelado no Antigo Testamento em passagens como Jó 1.7-2.7; 1 Cr 21.1 e Zc 3.1. 
  • No Novo Testamento outros nomes são dados a esse ser maligno. Diabo (diabolôs- caluniador, difamador, Mt 4.1; 13.39; 25; 41; Ap 12.9; 20.2), Serpente (2 Co 11.3; Ap 12.9; 20.2), Belzebu (Mt 10.25; 12.24, 27; Lc 11.15), Príncipe da potestade do ar (Ef 2.2), Príncipe deste mundo (Jo 12.31; 14.30; 16.11), maligno (Mt 13.19; 1 Jo 2.13) ou pai da mentira (Jo 8.44). 
Essas passagens, portanto, nos mostra o caráter hediondo desse ser maligno, o que se mostra também naqueles anjos que o seguiram, como se pode perceber,  por exemplo, nas passagens onde Jesus expulsa esses seres caídos de pessoas que aprisionavam (Mc 1.21-28; 9.14-29 Lc 8.26-34).

Não deve nos estranhar, nesse sentido, que o juízo de Deus esteja sobre a vida desses seres tão perversos (Gn 3.14, 15; 2 Pe 2.4, Jd 6) 

b) Compreendendo a abrangência da obra de Salvação
Existe entre nós um tendência para perverter o entendimento da obra divina de salvação sobre as nossas vidas. No período medieval, pensou-se, para se ter uma ideia, que a salvação era algo conquistado pelos esforços humanos; a compra de indulgências. Hoje, não muito diferente daqueles dias de densas trevas, resume-se a salvação quase que exclusivamente a uma decisão humana acrescida de uma oração de confissão no fim do culto. 

O quadro que a Bíblia nos mostra sobre a temática da salvação é, no entanto, bem mais amplo. São os pontos que os teólogos se referiram pelo termo Ordo Salutis, uma palavra de origem latina que significa Ordem da Salvação. 

Esses pontos são: 
  • Eleição: (Ef 1.3-4; 2 Ts 2.13)
  • Chamado: (Rm 10.14-15)
  • Regeneração: (Jo 3.3-8)
  • Conversão (arrependimento + fé): (Tg 1.18; 1 Pd 1.23)
  • Justificação: (Rm 5.1-10)
  • Adoção:(Rm 8.15)  
  • Santificação:  (1 Ts 5.23-24)
  • Perseverança: (1 Jo 2.19)
  • Glorificação:   (1 Co 15.12-14; Rm 8.23-25, 30). 

A partir desse quadro,  percebemos que a Bíblia não aponta para qualquer obra de Salvação na direção de Satanás e seus anjos. Por quê? Porque isso exigiria que Deus tivesse graciosamente ofertado todos os recursos que se vê na ordem de salvação em favor de Satanás e seus anjos.

c) Cristo e a Salvação
A Bíblia nos ensina claramente que o único caminho para a salvação é Jesus: "Respondeu-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim." (João 14:6) Também deixa claro que não há outro que possa salvar: "E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos" (Atos 4:12).

Mas esse salvador não veio a terra para socorrer a anjos: "Pois ele, evidentemente, não socorre anjos, mas socorre a descendência de Abraão" (Hb 2.16). E foi justamente, segundo o mesmo autor aos Hebreus, por assumir a natureza humana que se tornou o nosso redentor:  

14 Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo, 15  e livrasse todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a vida.
[...] 17  Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos pecados do povo. 18  Pois, naquilo que ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são tentados. (Hb 2.14-15, 17-18)

Gregório de Nizza (330-395), um dos Pais Capadócios, consegui capitar e expressar com grande lucides esse pensamento que encontramos no texto de Hebreus. Lutando conta o ensino de Apolinário (300-390), bispo de Laodicéia, que defendia que Cristo era Deus, mas não possuía uma alma humana, Gregório advogou o ensino bíblico de Cristo como ''verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus", porque "aquilo que Deus não assumiu, não redimiu".     

Conclusão:
Diante dos pontos aqui expostos, podemos concluir:
  • No plano redentor de Deus não existe oportunidade de salvação para o Diabo e seus anjos; 
  • O verbo assumiu a natureza humana para salvar aquele que se havia perdido, na linguagem de Mateus: o seu povo dos pecados deles.
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* A imagem parece retratar o inferno como um lugar de sofrimento apenas humano. Essa é uma ideia ainda muito comum em nossos dias. A narrativa bíblica, contudo, coloca o inferno como um lugar onde o Diabo e seus anjos também sofrerão. 

Pr Hebert Borges

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1 Comentários

  1. Mais um Excelente Artigo Pastor!
    Obrigado por nos abençoar com reflexões tão esclarecedoras.

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